Na semana em que o Brasil comemora 200 anos de sua Independência, dois grandes eventos simultâneos deverão traduzir o clima de polarização política que o país vive hoje.
Para o dia 7 de setembro, estão marcadas manifestações nas ruas de todo o país convocadas por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, com o Rio de Janeiro sendo o palco principal. A data coincide com o período do festival de música Rock in Rio, que começou na última sexta-feira (2) no Parque dos Atletas, também no Rio de Janeiro, e vai até o dia 11 de setembro.
Oficialmente, o festival não tem viés político, mas, a julgar pelo que ocorreu em março no Lollapalooza, em São Paulo, e pelo viés ideológico de grande parte dos artistas que estarão no Rock in Rio, é difícil imaginar que não se veja nenhum tipo de manifestação política contra Bolsonaro.
É provável que as demonstrações partam mais do público do que dos músicos, já que houve um cuidado dos organizadores do evento para orientar os artistas a estarem atentos à Lei Eleitoral durante o período de campanha. “Não será autorizada a presença de nenhum candidato a estas eleições em seus palcos”, disse a organização em um comunicado, recomendando que “todas as empresas, instituições e artistas envolvidos com o evento tenham conhecimento da Lei Eleitoral”.
Bolsonaro estará no Rio de Janeiro nos dias 7 e 8 de setembro, e o Rock in Rio terá shows dos dias 2 a 4 e dos dias 8 a 11.
Esta será a primeira vez em seus 37 anos que o festival acontecerá em período eleitoral. Os organizadores têm buscado definir o evento como apolítico e desassociá-lo de um dos lados da disputa eleitoral. Em entrevista de julho à revista Veja, a chefe da organização do evento, Roberta Medina, disse que “política não se faz em festival, nem com torcida, e sim com debate”.
Para os eventos do 7 de setembro, a tendência de politização tem preocupado as Forças Armadas, de acordo com a CNN. O Comando Militar do Leste do Exército Brasileiro estaria estudando colocar as autoridades presentes no desfile mais próximas do Forte de Copacabana e mais distantes do hotel Copacabana Palace, perto de onde se deverão concentrar atos pró-Bolsonaro. A ideia seria evitar dar um tom politizado às comemorações oficiais.
O que pode e não pode ser feito nos eventos?
A preocupação com o teor das manifestações durante os eventos não é por acaso: o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, usou a palavra “implacável” para definir como será a atuação da Justiça Eleitoral durante seu mandato.
O advogado Acácio Miranda, especialista em Direito Constitucional, diz que a liberdade de manifestação é assegurada pela lei mesmo durante o período eleitoral. Todos têm o direito de expressar suas opiniões, desde que não convertam os eventos em comícios – que, para ocorrerem, precisam ser declarados à Justiça Eleitoral.
“Um comício difere de uma manifestação pública. Passeatas não configuram, juridicamente, um comício. A liberdade de manifestação é assegurada. Por mais que no Rock in Rio, por exemplo, um candidato não possa se manifestar, o artista tem liberdade de expressão, desde que ele a exerça dentro dos limites legais. Ele não pode transformar o show num comício, mas pode manifestar a sua opinião”, explica.
Miranda reconhece que “isso carrega certo grau de subjetivismo”, mas diz que há dois aspectos mais importantes: que os candidatos não participem dos atos, e que o artista se expresse “dentro de um limite de razoabilidade, manifestando a opinião, sem fazer campanha”.
A situação muda para eventos oficiais, nos quais não se admite qualquer tipo de manifestação favorável a um lado político. Isso explica por que o Comando Militar do Leste estaria tentando desassociar ao máximo as celebrações oficiais dos 200 anos da Independência das manifestações pró-Bolsonaro.
“Em um evento custeado com o dinheiro público, não se pode fazer campanha, porque não se pode usar dinheiro público para campanha. Neste contexto, caso alguém faça alguma manifestação, aí sim nós estaríamos diante de uma ilegalidade”, diz Miranda.
Nas manifestações extraoficiais das ruas ou em um evento de caráter privado como o Rock in Rio, há mais flexibilidade, mas, mesmo assim, há certas restrições, em especial no que se refere à participação de candidatos.
“O candidato não pode pedir votos, porque nós estaríamos equiparando essa circunstância a um comício, e o comício depende de autorização da legislação eleitoral, o que nós não teríamos neste contexto”, explica o advogado. “Um comício deve ser divulgado antecipadamente como comício, para que só compareçam, por livre e espontânea vontade, as pessoas que estejam aderindo àquele candidato.”
eventos simultâneos ganham tom político
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